terça-feira, 24 de julho de 2007

TÓPICOS SOBRE IMAGINÁRIA BRASILEIRA

Primeiras imagens, primeiros artistas.

As primeiras imagens sacras brasileiras vieram da península Ibérica, e sua evolução terá como fonte principal à história da colônia, que se seguiu com conteúdos econômicos, políticos e socioculturais. A primeira imagem sacra aportada no Brasil foi uma escultura representando N. Sra. da Esperança, trazida por Pedro A. Cabral. Essa imagem desembarcou em Porto Seguro, em 1500, e participou das celebrações da primeira missa. Não fica, entretanto no Brasil, tendo retornado a Portugal, encontrando-se hoje na Quinta de Belmonte.

Posteriormente as imagens foram trazidas pelos missionários jesuítas com a função de catequizar os nativos. Os fidalgos também contribuíram para a vinda de outras peças artísticas ao Brasil. Tudo durante o processo de colonização. São raros os documentos que referenciam a vinda das obras de arte do século XVI.

São poucas as peças que se conservaram até hoje. Isso devido à ação do tempo ou por falta de uma conservação adequada e também pela destruição intencional. Sabe-se que os holandeses, protestantes, destruíram e profanaram igrejas, tanto na Bahia, quanto em Pernambuco, no século XVII.

O pintor holandês Franz Post, no século XVII, retratou em suas telas algumas igrejas sem teto na cidade de Olinda, destruídas por incêndios propositais praticados pelos invasores holandeses. A Sé da Bahia, p. ex., e outras igrejas baianas foram profanadas e tiveram muitas peças destruídas. É possível que valiosas imagens sacras do primeiro período de nossa colonização tenham desaparecido nesses conflitos.
As Primeiras Imagens

As dez imagens, das mais antigas, que possuem documentos relativos à sua chegada no Brasil, são as seguintes:

a) São Francisco: Trazida por Gonçalo Coelho, em 1502, para Porto Seguro, onde se encontra.
b) N. Sra. da Graça: Encontrada por Catarina Paraguaçu, em 1530. Orago da igreja da Graça, Salvador.
c) N. Sra. da Conceição (Virgem de Anchieta): Trazida por Martinho Afonso de Souza. Capitania de S. Vicente, Itanhaém, SP.
d) N. Sra. das Maravilhas: Trazida para Salvador, em 1552, pelo primeiro Bispo do Brasil.
e) N. Sra. da Penha: Trazida por Frei Pedro Palácios, em 1558, para a capitania do Espírito Santo.
f) N. Sra. com o Menino (Venerada como Conceição): Vinda de Portugal ou confeccionada no Brasil, em 1560.
g) Sto. Antônio: 1560, em São Vicente, SP.
h) Cristo Crucificado: 1580. Encontra-se hoje no Museu do Carmo, Salvador, BA.
i) N. Sra. de Guadalupe: 1590. Venerada na Antiga Sé da Bahia. Encontra-se Hoje no Museu de Arte Sacra, Salvador, BA.
j) N. Sra. da Conceição: 15?. Faz parte do acervo da Catedral Basílica de Salvador, BA.

Primeiras Produções Artísticas - Pintura e Escultura.

Na época das Feitorias e durante o ciclo das Capitanias hereditárias, praticamente inexistiram na Colônia manifestações artísticas. Seu aparecimento está diretamente ligado à estabilidade da terra, principalmente com a implantação do Governo Geral na Bahia, em 1549, com a chegada de Tomé de Souza. Os primeiros monumentos surgem na Bahia e logo após em Pernambuco, São Vicente (SP), Paraíba, Espírito Santo e Rio de Janeiro, pontos materialmente mais desenvolvido do território.
Vale lembrar que vieram com Tomé de Souza mestres pedreiros, mestres carpinteiros, serralheiros, canteiros, oleiros, fabricantes da cal etc., mas não consta nome de nenhum artista.
Escultores e pintores, em número reduzido, chegaram alguns anos mais tarde. Em 1560, estava na Bahia o pintor jesuíta Manuel Álvares, onde pintou o frontispício da igreja do Colégio da Bahia. Manuel Sanches, também jesuíta, chegou à Bahia em 1574, e Belchior Paulo, outro talento, foi bastante ativo antes de 1600 na Bahia, Pernambuco e Espírito Santo, onde provavelmente conheceu e retratou o Pe. Anchieta.
Segundo D. Clemente Nigra, as primeiras imagens religiosas feitas no Brasil, foram confeccionadas em barro pelo escultor João Gonçalo Fernandes (ou Viana) em 1560. Morava na Bahia, mas residiu em São Vicente para pagar pena por um delito cometido, e lá na prisão executou as imagens de N. Sra. da Conceição de Itanhaém, N. Sra. do Rosário de São Vicente e um Sto. Antônio para uma fazenda na ilha de Sto. Amaro. Eduardo Etzel, examinando as três peças, acha impossível serem do mesmo autor, devido às diferenças estilísticas e de material. O certo é que inexistem documentos que possam comprovar tal atribuição. De qualquer forma João Gonçalo aparece em documentos antigos como o nosso primeiro escultor.
Ainda no século XVI aparece o nome do arquiteto e escultor Frei Francisco dos Santos que, para D. Clemente, "enriqueceu as igrejas de sua construção com imagens de barro, tanto em Olinda e Salvador, como em Iguaraçu, Paraíba, Vitória e Rio de Janeiro". Não existe, porém, qualquer peça que lhe possa ser atribuída.
Fala-se também na execução de imagens de marfim e madeira, sem, entretanto haver referência aos seus autores. Tudo ou quase tudo vinha de Portugal. Poucas imagens eram produzidas no Brasil, inclusive de qualidade discutível.
Principais artistas e suas épocas.
Séc. XVI:
João Gonçalo Fernandes e Frei Francisco dos Santos.

Séc. XVII:
Frei Agostinho da Piedade (1580? - 1661) - Salvador Ba. Frei Agostinho da Jesus (1600(10) - 1661)
Frei Domingos da Conceição e Silva (1643 - 1718)


SÉCULO XVIII:
Bahia:
Francisco das Chagas, o "Cabra".
Félix Pereira Guimarães (1756-1809)
Manoel Inácio da Costa (1763-1857)
José Antônio de Araújo Lobo (1747-1817).

Minas Gerais:
Mestre Piranga
Francisco Vieira Servas
Antônio Francisco Lisboa (1730(8)-1814)

Pernambuco:
Antônio Splander Aranha
João Pereira
Luís Nunes
Rio de Janeiro:
Manuel de Brito
Francisco Xavier de Brito
Valentim da Fonseca e Silva (1745-1813)


SÉCULO XIX
Bahia:
Manuel Inácio da Costa
Domingos Pereira Baião (1825-1871)
Bento Sabino dos Reis (1763-1843)

Pernambuco:
Manuel da Silva Amorim (1780-1873)


A propagação do culto aos santos teve as seguintes causas:

a) orientação do Concílio de Trento;
b) ação dos religiosos das ordens primeiras: Jesuítas, beneditinas, franciscanas e carmelitas;
c) o grau de religiosidade do povo, o que resultou na proliferação de grande quantidade de imagens, pictóricas e escultóricas nos santuários católicos.

As esculturas sacras variam conforme a época e a região. Isso devido a fatores de ordem econômico-social e geográfica.

As influências sobre as esculturas e pinturas sacras do período colonial brasileiro são evidentemente marcadas pelas culturas lusitana, espanhola, italiana, francesa e oriental - sobretudo de pontos culturais chineses.

As influências indígena e africana inserem-se na troca simbólica do fazer artístico, muito usada pelos missionários, nas feituras de retábulos, sobretudo, e nas fachadas de igrejas jesuíticas.

Do ponto de vista africano fica a marca nas construções de igrejas, como a igreja de N. S. do Rosário, no Pelourinho, em Salvador, que foi construídas por escravos africanos. Todavia, essa questão não se limita à arquitetura, está, também voltada no campo da escultura.

A expansão colonial portuguesa esteve estreitamente ligada à evangelização. Jesuítas, franciscanos, carmelitas, beneditinos e outras ordens, que tiveram papel fundamental na construção de uma arte sacra cristã no Brasil.

Na sociedade brasileira, a educação era monopólio dos religiosos, sendo a ordem jesuíta a que mais se destacou no período colonial - sobretudo entre o início do século XVII e a década de 1760.

A propaganda da Contra-Reforma teve ação modeladora na sociedade brasileira colonial, na qual predominavam os valores religiosos, de caráter rural, onde riscos e pobres se rejubilavam no desejo comum de que a riqueza e brilho embelezassem e se acumulassem nas igrejas.

O culto a imagens sacras prolifera-se no Brasil com o processo da colonização européia devido a dois fatores:
a) O Brasil ser uma colônia que estava sob a égide da igreja;
b) O Brasil vivia sob os auspícios do Estado português, que por seu lado estava ligado à instituição da Igreja Católica.
Daí, do ponto de vista artístico, pode-se concluir que:
a) O Barroco está intimamente ligado à doutrina do Concílio de Trento e à propagação da fé;
b) O Barroco é aristocrático e popular ao mesmo tempo, dada a sua intenção em aproximar-se das camadas populares.
A partir desses tópicos, procurando analisar as épocas, pode-se afirmar que:
a) O século XVII é a fase do autoritarismo, no qual está associada à concepção da hierarquia, o direito de procedência e o grau de manutenção da autoridade;
b) o século XVIII é a fase do ceticismo, ao qual está associada à idéia de liberdade, da concepção racionalista do mundo, que resulta, entre outras coisas, no questionamento e desafio à autoridade.

Portanto, do ponto de vista histórico, sob o prisma religioso, pode-se identificar vários efeitos:

a) Efeitos da Reforma Luterana:
- A escultura e a pintura e a pintura de temática religiosa desaparecem nas igrejas protestantes;
- a valorização de temática realista está voltada para a natureza, para o homem etc.
b) Efeitos da Contra-Reforma:
- Proibição de temas heréticos, irrelevantes;
- profusão de representações, tanto pictóricas, quanto escultóricas da Virgem Maria, dos mártires, santos em estado de êxtase ou meditação;
- qualidade evocativa e instrutiva da arte em relação à fé.
c) Efeitos da arte como veículo de propaganda:
- Iconografia religiosa;
- questão política, sobretudo entre monarcas e aristocracia.
O mecenato artístico do período barroco acontece do mesmo modo que no Renascimento, com a Igreja, a corte e a aristocracia. A novidade está no fato de que na fase do barroco as classes médias começam a desempenhar um papel ativo no campo do mecenato, embora ainda não decisivo - com exceção da Holanda.

No Brasil, além da Igreja, esse mecenato esteve a cargo das elites sociais de senhores rurais, grandes comerciantes e irmandades leigas.

Analisando as implicações religiosas, políticas, econômicas e sociais do Barroco, também se pode concluir que ele está mais ligado aos países católicos do que aos países protestantes; mais ligado inclusive aos países católicos fiéis ao Papa, do que aqueles que, embora católicos, adotaram uma política religiosa mais independente em relação a Roma - a França, p. ex.

No Brasil, a fase colonial, a arte é predominantemente religiosa. Os principais centros produtores são: Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Maranhão, Minas Gerais e Pará - este especificamente a cidade de Belém.

No litoral, foi importante a atuação das ordens primeiras e das confrarias, irmandades e ordens terceiras, sobretudo em Minas Gerais.

No seu estudo sobre arte colonial brasileira, R. Smith estabelece três fases distintas na nossa arquitetura religiosa, a saber: fase missionária, fase monumental e fase mundana. Esta classificação baseia-se na análise de elementos, como por exemplo: planta, fachada, elementos da fachada e interiores. Outros aspectos a serem considerados na análise e classificação da nossa arquitetura colonial são os processos e técnicas construtivas, os materiais empregados, os estilos e influências recebidos.

A primeiras imagens sacras - escultóricas e pictóricas - que ornavam as primeiras capelas eram originárias da metrópole. Inicialmente, os materiais mais empregados eram o barro-cozido e a madeira, devido à facilidade de obtenção da matéria prima. Mais tarde emprega-se também a pedra, o marfim (mais raro) e o metal.

Na produção escultórica dos primeiros séculos predomina o anonimato, cuja causa talvez possa ser explicada pela mão de obra empregada, como também pelo móvel da criação.
Considerando os aspectos essencialmente de ordem técnica podemos estabelecer três categorias para as imagens sacras:

a) imagens eruditas
b) imagens semi-erudita
c) imagens populares.

Pode-se observar ainda variações não apenas relacionada à época, mas também a regiões. Essas diferenciações são determinadas pelo acabamento da escultura, pela policromia e pelo material empregado.

Quanto a uma análise que visa determinar época ou estilos, pode-se tomar como pontos de referência à cabeça e cabelos, a estruturação formal e panejamento, a pintura, a base ou peanha, os materiais empregados.

Além das imagens de culto, tem-se também como exemplos de escultura do período colonial os ex-votos, as figuras de presépio, que se mostram uma tradição ibérica trazida à colônia. Assim como a escultura, a pintura também sofreu influências italianas, flamenga, oriental etc., e também de elementos autóctones. As técnicas empregadas variavam entre a têmpera, óleo, esmalte e raríssimas vezes o afresco. Além dos temas sacros, cujos modelos eram extraídos pela pintura colonial, encontramos temas ex-votivos, retratos, históricos e pastoris. Mas é no século XVIII que a pintura colonial brasileira alcança seu apogeu, sobretudo com a pintura de tetos - embora não sendo uma conquista do barroco -, onde o ilusionismo alcança o máximo de seus recursos. O ilusionismo do barroco fundamenta-se no desejo de atingir o máximo de realismo, de fidelidade e representação vívida e convincente, da natureza ideal. Com ele atinge-se a superação de limitações dos materiais, possibilita uma nova relação entre a obra e o espectador, no qual o espaço não se restringe apenas à obra, pelo contrário, extrapola.

Pode-se também dizer que no barroco se dá a fusão das artes, ou seja, a arquitetura torna-se mais escultural, a escultura mais pictórica e a pintura, por sua vez, mais voltada para as aparências visuais, i.e., enfatiza mais a luz, a sombra e a cor, do que a linha e a forma, resultando com isso uma representação da percepção dos objetos do que no conhecimento dos mesmos.

Caracterização Da Imagem Escultórica Quanto À Época.

a) Séculos XVI/XVII.
- Linha de prumo em relação à cabeça cai ao meio dos pés (simetricamente à imagem);
- maior volumetria na parte inferior;
- anatomia simplificada;
- ausência de emoção - expressão indefinida;
- policromia executada diretamente no suporte, sem aparelhamento;
- panejamento com pregas em linhas retas, sem preocupação com movimento e na maioria das vezes cobrindo os pés;
- olhos pintados, maior valorização da forma em detrimento à decoração;
- atitudes hieráticas;
- peanhas simples.
b) Século XVIII:
- Linha de prumo caindo sobre um dos pés (geralmente esquerdo)
- maior volumetria na parte superior;
- maior domínio de anatomia;
- maior realismo expressivo a exploração de estados de emoção;
- panejamento movimentado em diagonal e pés descobertos;
- simbolismo no uso das cores;
- olhos de vidro, véu com muita movimentação;
- peanhas com anjos, nuvens, serafins e querubins.
- no final deste século, vai haver um alongamento das imagens (7 ½ e até 8 módulos). Como também haverá uma modulação alongada
c) Século XIX:
- Panejamento com movimentação mais contida, mais ao gosto neoclássico:
- gestos e expressão facial retomam a serenidade clássica;
- maior movimento no panejamento que na expressão;
- aumento de quantidade em detrimento de qualidade;
- surgimento das imagens de gesso (produção em série)

Diferenças Regionais


O desenvolvimento da imaginária brasileira colonial esteve em função das condições - e importância - econômica, social e de certa forma cultural das diferentes regiões onde ela se manifestou.
a) Imagens baianas:
- Forte influência portuguesa;
- uso do esgrafiato e delicada pintura sobre ouro;
- exagero na movimentação;
- atitudes dramáticas (influência espanhola)
- mãos expressivas;
- imagens em pedra-sabão.

b) Imagens pernambucanas:
- Mais alongadas do que as baianas;
- ausência de volumetria na parte posterior (costas)
- pouco uso do barro cozido)
- maior esgrafiato que as baianas, e uso de elementos geométricos que fitomorfos;
- policromia em tons mais suaves;
- desenhos contínuos.


c) Imagens paulistas:
- Influência das imagens da Bahia e Pernambuco;
- menor preocupação com policromia;
- intensificação de pequenas imagens de barro cozido paulistinhas.


d) Imagens Mineiras:

- Panejamento mais angular;
- dramatização (influência espanhola)
- grande expoente - Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.